O médico e a Ponte
Enquanto voltava para casa, Alysson um médico conceituado na pequena cidade de Paraíso, avistou um homem ao longe, fora da grade de proteção da ponte. Estava de noite e não sabia ao certo se era um homem ou uma mulher e nem ao menos o que aquela pessoa estava fazendo ali e talvez fosse perigoso ir até lá, mas o médico fez aquilo que não podia fazer com seus pacientes, assumir o risco. Alysson ficou ao lado da pessoa misteriosa, ela até agora nada tinha dito, mesmo depois de chegar ao lado dela, ele a observou e apesar da escuridão quase total, percebeu que estava de capuz e tremendo um pouco e era cerca de 15 centímetros mais baixa que ele.
"Boa noite rapaz, o que está fazendo aqui a essa hora da noite?" - Perguntou em tom tranquilizador.
"Vim pular da ponte, vim me suicidar." - Respondeu a moça. Alysson teve algumas aulas na faculdade sobre como ajudar e se portar perante suicidas, lembrava muito pouco dessas aulas, mas uma vida estava em risco nessa situação e como médico, não poderia perder uma vida com a chance de salva-la.
"Desculpe por chama-la de rapaz, antes de você fazer o que está pensando, peço que converse um pouco comigo. Se não se incomodar responder, quero que me diga sua idade e porquê está pensando em se matar." - Indagou Alysson, que apesar de seu medo de perder uma vida em sua frente manteve sua voz calma.
"Antes de conversarmos eu tenho uma condição se ela for satisfeita podemos conversar, minha condição é que você não tente me salvar pela força física, isto é, se eu decidir pular não tente me puxar para trás, posso acabar te levando comigo, ou pior, não morrendo." - Agora que tinha falado seus termos estava mais tranquila, tinha parado de tremer, e aguardava a resposta do homem para saber seu próximo ato.
"Aceito seu termo, mas também contenho comigo uma condição, quero que você responda as minhas indagações anteriores e também diga seu nome, o meu é Alysson." - Perguntou o nome da moça porque facilitaria o processo de convencimento, tornaria a conversa mais próxima e poderia chama-la pelo nome, o que para ele significava humanização.
"Meu nome é Arya, tenho 15 anos e quero me suicidar porque não acho que a vida tenha sentido, não acho que vale a pena ser vivida e por último não fará diferença se vivo ou morro, como diferença não faço prefiro a morte, escolho a morte" Disse em alto e bom som, sem medo nenhum de chocar o rapaz que estava com ela, e sobretudo sem medo algum de dizer qualquer uma daquelas palavras, se estava pronta para tirar sua vida, teria que estar pronta para dizer o porquê daquela decisão, pelo menos era isso o que pensava.
Alysson analisou cada palavra da frase de Arya, cada um dos problemas, "Se eu conseguir convencê-la que cada um de seus motivos são falhos, tenho certeza que ela não cometerá tal ato, devo tomar cuidado, pela forma em que ela usa as palavras e pela forma que fala, é bastante inteligente, ainda tem o fator de ser adolescente... vai ser difícil mas a única escolha é tentar" pensou consigo mesmo. Alysson passou um bom tempo analisando a frase e ainda mais tempo pensando no que responder.
"Deus não faria a vida ter sentido?" No momento em que completou a frase, percebeu o grande erro que tinha cometido, lembrou-se de uma das aulas em que a professora havia alertado aos alunos para em hipótese nenhuma falar sobre religião ou Deus. Assim que Alysson percebeu o erro que havia cometido, sentiu um calafrio na espinha e sentiu pela primeira vez em muitos anos medo, mesmo sendo médico ele sempre sentia que tinha dado o máximo de si para salvar seu paciente, agora não tinha esse sentimento, e não ter esse sentimento o causou o mais profundo dos terrores.
"Deus dá sentido á vida, porém Deus não existe. Deus é a enganação que todos acreditam, sem a ideia falsa de Deus, não poderiam suportar a realidade, estariam como eu estou agora, estariam vivendo a realidade, descobririam da pior maneira o que é a real."
Alysson ficou desamparado com aquela resposta, em toda a sua vida nunca tinha conhecido alguém que não acreditasse em Deus, havia conhecido pessoas que não eram praticantes assim como ele, mas todas elas sabiam que Deus existia, sabiam ou acreditavam que ele existia?
Ainda que dúvidas pairavam em sua cabeça não poderia demonstrar incertezas perante a garota, decidiu por fim continuar sua argumentação.
"Eu sou médico e como médico, vejo constantemente coisas inexplicáveis, se não há Deus, como poderia explicar o inexplicável?" - Alysson falou com certa certeza e com um pouco de soberba em sua voz.
"O argumento do desconhecimento é Deus. Vikings não conseguiam explicar os trovões e portanto atribuíram a ideia de um Deus que criasse os trovões, Cristãos não conseguiam explicar o sentido da vida então criaram um Cristo para que os dessem motivo de vida. O inexplicável sempre existiu, nunca chegaremos ao ponto de sabermos tudo mas isso não prova por si só a existência de Deus." - Arya continuava com sua voz pacífica.
Outra vez, Alysson não conseguia sequer convence-la de um único argumento. Apenas aceitava que havia perdido e ia para outro argumento, mas suas tentativas estavam acabando e ele estava falhando. Suas mãos começaram a tremer e a suar, para esconder isso ele franziu a testa e botou as mãos no bolso, como se estivesse sentindo frio. Ainda tinha um último argumento, uma ultima tentativa e dessa vez acreditava ser impossível falhar, pois falava a verdade.
"Ainda que tudo o que você me falou seja verdade, ainda sim existe motivos para viver, pode ser desde viver o máximo de prazer ao se dedicar a melhorar a vida de outras pessoas, a inexistência de Deus não é forte o suficiente para a inexistência do motivo da vida. Mesmo que não exista um motivo, ainda sim viver é melhor que a morte. O sofrimento é melhor que o nada." - Dessa vez o Médico falou talvez a única certeza que tivesse agora. Falou com o coração e falou o que era a verdade.
"Todos aqueles que não sofrem são os primeiros a achar que o nada é pior que o sofrimento. O sofrimento profundo é uma dor insuportável no sentido literal da palavra. O sofrimento que eu sinto faz o nada parecer a melhor coisa que poderia acontecer. Quando se vive no inferno qualquer coisa é o paraíso." - Dessa vez podia-se perceber um tom melancólico na voz de Arya, um tom de sofrimento e perda. Como era sua única e última chance de salvar a garota da ponte, não desistira tão fácil como das outras vezes.
"Deus dá sentido á vida, porém Deus não existe. Deus é a enganação que todos acreditam, sem a ideia falsa de Deus, não poderiam suportar a realidade, estariam como eu estou agora, estariam vivendo a realidade, descobririam da pior maneira o que é a real."
Alysson ficou desamparado com aquela resposta, em toda a sua vida nunca tinha conhecido alguém que não acreditasse em Deus, havia conhecido pessoas que não eram praticantes assim como ele, mas todas elas sabiam que Deus existia, sabiam ou acreditavam que ele existia?
Ainda que dúvidas pairavam em sua cabeça não poderia demonstrar incertezas perante a garota, decidiu por fim continuar sua argumentação.
"Eu sou médico e como médico, vejo constantemente coisas inexplicáveis, se não há Deus, como poderia explicar o inexplicável?" - Alysson falou com certa certeza e com um pouco de soberba em sua voz.
"O argumento do desconhecimento é Deus. Vikings não conseguiam explicar os trovões e portanto atribuíram a ideia de um Deus que criasse os trovões, Cristãos não conseguiam explicar o sentido da vida então criaram um Cristo para que os dessem motivo de vida. O inexplicável sempre existiu, nunca chegaremos ao ponto de sabermos tudo mas isso não prova por si só a existência de Deus." - Arya continuava com sua voz pacífica.
Outra vez, Alysson não conseguia sequer convence-la de um único argumento. Apenas aceitava que havia perdido e ia para outro argumento, mas suas tentativas estavam acabando e ele estava falhando. Suas mãos começaram a tremer e a suar, para esconder isso ele franziu a testa e botou as mãos no bolso, como se estivesse sentindo frio. Ainda tinha um último argumento, uma ultima tentativa e dessa vez acreditava ser impossível falhar, pois falava a verdade.
"Ainda que tudo o que você me falou seja verdade, ainda sim existe motivos para viver, pode ser desde viver o máximo de prazer ao se dedicar a melhorar a vida de outras pessoas, a inexistência de Deus não é forte o suficiente para a inexistência do motivo da vida. Mesmo que não exista um motivo, ainda sim viver é melhor que a morte. O sofrimento é melhor que o nada." - Dessa vez o Médico falou talvez a única certeza que tivesse agora. Falou com o coração e falou o que era a verdade.
"Todos aqueles que não sofrem são os primeiros a achar que o nada é pior que o sofrimento. O sofrimento profundo é uma dor insuportável no sentido literal da palavra. O sofrimento que eu sinto faz o nada parecer a melhor coisa que poderia acontecer. Quando se vive no inferno qualquer coisa é o paraíso." - Dessa vez podia-se perceber um tom melancólico na voz de Arya, um tom de sofrimento e perda. Como era sua única e última chance de salvar a garota da ponte, não desistira tão fácil como das outras vezes.
"Se você parar o mar, nunca saberá o que a maré trará. Talvez se continuar existindo mesmo que seu sofrimento continue por muito tempo, algum dia conseguirá se livrar dele e perceber que valeu a pena, só saberá disso se continuar vivendo, mesmo que sofrendo." - Alysson agora tinha usado todas as suas cartas cabia a Arya decidir seu futuro.
Silêncio pairou sobre Arya. Silêncio pairou sobre Alysson. O silêncio era extremamente incômodo para o médico, já que ele sempre preferiu um não do que um talvez. Não ter a resposta se ela seria salva ou não incomodava mais do que ela preferir não viver. E ainda assim ele escolheu esperar pela resposta, sem dizer uma palavra para apressar ela.
"Certamente, talvez um dia eu possa ver que a maré pode também acolher ao invés de apenas bater. Mas ainda assim é muita dor e sofrimento para um talvez, com a morte eu tenho a certeza do paraíso, com a vida eu tenho a dúvida e o sofrimento. É uma escolha pessoal minha, infelizmente está decidido meu destino. Escolho parar o mar." - Estranhamente a voz de Arya apresentava felicidade e alegria embora suas palavras ressaltassem a dor.
Alysson não conseguia compreender, tentou ao seu máximo ajudar alguém que poderia ser salva, tentou ao máximo salvar uma vida e ainda assim não tinha chegado nem perto, por que Deus não o havia ajudado? Só existia uma explicação para aquilo, Deus realmente não existia, tudo o que a garota falara agora parecia a realidade. O médico percebeu então que toda a sua vida vivia uma mentira, tinha escolhido ser médico para salvar vidas, para glorificar o bem da vida a Deus, aquilo já não fazia mais sentido. Nada fazia mais sentido. Repensou toda sua vida, sob uma perspectiva falsa e agora só existia uma coisa a se fazer.
Alysson percebendo que continha a verdade em suas mãos, empurrou Arya da ponte. Arya não gritou, enquanto caía, falou em voz alta para si mesma:
"Eu te venci Deus, eu finalmente me vinguei de ti por ter me colocado no inferno. Transformei seu herói em um vilão, transformei-o em um assassino. Mesmo apesar do sofrimento ainda sim sou mais inteligente do que você, nos vemos em breve."
Alysson chocado com o que tinha acabado, não por te-la matado, mas por não sentir remorso algum mesmo depois de faze-lo. Alysson não olhou para Arya caindo, apenas seguiu andando para frente sem rumo, dizendo a si mesmo:
"Se Deus não existe, tudo é permitido."
Obrigado por Ler o conto, se você leu até aqui contarei algumas alegorias que usei durante o conto, caso não queira saber é só não ler.
O conto se chama O médico e a Ponte, não apenas por ter o médico como personagem e a ponte como lugar, mas também pelo fato de a ponte representar a estrada do médico até a verdade que ele julga ter encontrado.
Paraíso, o nome da cidade faz jus a vida do médico ser o céu enquanto a de Arya o inferno.
Arya, nome baseado na personagem de mitologia grega Ariadne (Na mitologia Ariadne ajuda Teseu a sair do labirinto com um fio de lã vermelho) usei esse nome pelo motivo de Arya revelar verdades ao Médico e ao mesmo tempo ir enrolando ele até o desfecho que ela queria, como uma aranha enrolando uma presa.
"Nada fazia mais sentido.", Frase com sentido ambíguo, 1- o Nada fazia mais sentido do que o que ele julgava verdade. 2- Nada mais na vida dele fazia sentido.
Silêncio pairou sobre Arya. Silêncio pairou sobre Alysson. O silêncio era extremamente incômodo para o médico, já que ele sempre preferiu um não do que um talvez. Não ter a resposta se ela seria salva ou não incomodava mais do que ela preferir não viver. E ainda assim ele escolheu esperar pela resposta, sem dizer uma palavra para apressar ela.
"Certamente, talvez um dia eu possa ver que a maré pode também acolher ao invés de apenas bater. Mas ainda assim é muita dor e sofrimento para um talvez, com a morte eu tenho a certeza do paraíso, com a vida eu tenho a dúvida e o sofrimento. É uma escolha pessoal minha, infelizmente está decidido meu destino. Escolho parar o mar." - Estranhamente a voz de Arya apresentava felicidade e alegria embora suas palavras ressaltassem a dor.
Alysson não conseguia compreender, tentou ao seu máximo ajudar alguém que poderia ser salva, tentou ao máximo salvar uma vida e ainda assim não tinha chegado nem perto, por que Deus não o havia ajudado? Só existia uma explicação para aquilo, Deus realmente não existia, tudo o que a garota falara agora parecia a realidade. O médico percebeu então que toda a sua vida vivia uma mentira, tinha escolhido ser médico para salvar vidas, para glorificar o bem da vida a Deus, aquilo já não fazia mais sentido. Nada fazia mais sentido. Repensou toda sua vida, sob uma perspectiva falsa e agora só existia uma coisa a se fazer.
Alysson percebendo que continha a verdade em suas mãos, empurrou Arya da ponte. Arya não gritou, enquanto caía, falou em voz alta para si mesma:
"Eu te venci Deus, eu finalmente me vinguei de ti por ter me colocado no inferno. Transformei seu herói em um vilão, transformei-o em um assassino. Mesmo apesar do sofrimento ainda sim sou mais inteligente do que você, nos vemos em breve."
Alysson chocado com o que tinha acabado, não por te-la matado, mas por não sentir remorso algum mesmo depois de faze-lo. Alysson não olhou para Arya caindo, apenas seguiu andando para frente sem rumo, dizendo a si mesmo:
"Se Deus não existe, tudo é permitido."
Obrigado por Ler o conto, se você leu até aqui contarei algumas alegorias que usei durante o conto, caso não queira saber é só não ler.
O conto se chama O médico e a Ponte, não apenas por ter o médico como personagem e a ponte como lugar, mas também pelo fato de a ponte representar a estrada do médico até a verdade que ele julga ter encontrado.
Paraíso, o nome da cidade faz jus a vida do médico ser o céu enquanto a de Arya o inferno.
Arya, nome baseado na personagem de mitologia grega Ariadne (Na mitologia Ariadne ajuda Teseu a sair do labirinto com um fio de lã vermelho) usei esse nome pelo motivo de Arya revelar verdades ao Médico e ao mesmo tempo ir enrolando ele até o desfecho que ela queria, como uma aranha enrolando uma presa.
"Nada fazia mais sentido.", Frase com sentido ambíguo, 1- o Nada fazia mais sentido do que o que ele julgava verdade. 2- Nada mais na vida dele fazia sentido.
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